O Poço
Quando o conheci, já era uma estrutura
de puro sentimento,
mais um resquício do que um lugar, cobrindo a antiga
e negligenciada profundidade que conduzia
para a água. O tio da minha mãe, cuja voz
não me lembro de alguma vez
ter ouvido, construiu o muro alto sabendo que se afundaria
por causa dos plátanos -
caçadores de água fantasmagóricos - aparentemente fora
de lugar, e um poço onde
devia ter notado haver demasiados fetos. A mesma
água da casa
mais tarde ficaria clara por comparação,
tépida, domado pela torneira
e o cano, a bacia e o ralo, as nossas mãos gretadas
sempre nele, debaixo dele.
Não é assim tão difícil compreender agora o que foi
durante tanto tempo irreconhecível,
um dado adquirido, essa fonte como ausência de algo,
o afastamento de tudo isso -
o cano, a casa, nós - tudo isso, tão perfeito
como se fosse invisível.
Claudia Emerson, impossible bottle: poems, Louisiana State University, 2015.
Versão Portuguesa © Luísa Vinuesa